'O Que Deu no Bicho?' é o segundo álbum de sambas de André Bertini


Divulgação

Por Naiara Lima

Em meio à grande diversidade de artistas, Piracicaba também se destaca como terra de samba autoral. Não são poucos os que se dispõem a trabalhar com a música mais popular do país, e André Bertini é um deles. Depois de três anos, o compositor divulga seu segundo álbum, O Que Deu no Bicho?. O pré-lançamento acontece no Colombina Bar e Música nesta sexta-feira (22), às 20h30.

O registro, primeiro do selo Fio de Bigode Records, do próprio Bertini, já está disponível para ser baixado. São dez faixas que revelam o amadurecimento do músico, que, além de cantar, aparece mais atuante na produção. Ele conversou com o PiaparaCultural sobre o novo trabalho. Confira!

Quais as principais descobertas que teve no primeiro álbum, Fio de Bigode (2013), que foram importantes para O Que Deu no Bicho??
Meu primeiro álbum, muito bem produzido pelo sambista e amigo Juca Ferreira, não teve os meus ouvidos tão atentos à produção, à gravação, em si. Eu ouvia as guias meio que já prontas – gostava, claro, porque sabemos do talento do Juca, mas o envolvimento maior com o pesado da produção foi dele; cheguei mais como autor das faixas. 

Em O Que Deu no Bicho?, eu, de fato, mergulhei na parte de produção, auxiliado pelo Emilio Moreira, que fez os arranjos de todas as faixas. Trabalhamos meses antes de gravarmos, escolhendo arranjos, temas, instrumentos, enfim. O disco teve uma pré-produção pesada, tudo arrumado para poder ser gravado, grande parte dele, ao vivo.

Qual foi a repercussão de Fio de Bigode?
Muito boa! Ele foi distribuído pela Tratore, que acabou colocando-o no mundo inteiro. Vendemos discos para países como Canadá, França, Portugal e Japão. Já pensou um japonês ouvindo Fio de Bigode? Também teve destaque em premiações nacionais: pré-selecionado para o Prêmio Vale de Música e recebeu menção honrosa do site Embrulhador. Teve gente de bem longe me adicionando em rede social para falar que gostava bastante da minha música, que o disco não saía do rádio, e tal. É muito gratificante!

O Que Deu no Bicho? não é o nome de uma canção. O que te deu para colocar esse título no material?
Basicamente duas razões: a primeira é que o disco traz uma temática de boteco, de boemia, de jogo do bicho; a segunda é porque, no primeiro álbum, só interpreto uma faixa, ao lado da Eliane Faria, e neste canto em todas. Aí, veio esse trocadilho famigerado [risos].

Quais foram seus principais parceiros para o álbum?
Parceiro de composição, só em duas faixas: Ana Mara e Vingança Cruel, ambas com Nuno Moraes, meu amigo – outro famigerado [risos]. O disco também tem uma participação de peso, internacional, da angolana Jéssica Areias, radicada em São Paulo e que emprestou seu talento vocal dividindo comigo Santo Onofre. Ficou uma maravilha! Além do mais, todos os músicos são amigos e parceiros, acreditaram no projeto: Saulo Ligo, Emilio Moreira, Rui Kleiner, Xeina Barros, Estela Manfrinato, Paulinho Leme, Fernando Caselato, Eliezer Silva e Otiniel Aleixo, o Legal. Sem eles, não existiria disco.

A mim, parece que seu samba é daquele fundo de quintal, mas também identifico algo do samba paulista e de outros. Quais são as suas referências?
Ouço de tudo, bastante e compulsivamente. Sou muito mais fã de música popular do que compositor. Sou viciado em Chico Buarque, a ponto de começar a ouvir de manhã e só parar de madrugada. Você já ouviu aquele de 1989 dele, o que tem o Morro Dois Irmãos como primeira faixa? Não é uma obra-prima? Aí você ouve um disco desse peso e até repensa o fato de ser compositor, porque está tudo ali. O mesmo acontece quando ouço a poesia do Paulo César Pinheiro, as crônicas que nos colocam dentro das músicas do Adoniran, a precisão cirúrgica do Paulo Vanzolini – o cara conseguia dizer um universo em uma frase: "Quando eu for, eu vou sem pena, pena vai ter quem ficar".

Gosto de ouvir coisas novas também. No Rio de Janeiro, tem uma garota chamada Luísa Lacerda, que descobri recentemente, fuçando vídeos na internet. É simplesmente fantástica, uma cantora completa! Todos precisam ouvi-la, porque música é o que ela canta. Antes, já havia conhecido a Jéssica Areias da mesma forma, outro talento vivo! Eliane Faria, Lello di Sarno, compositor de mão cheia, Estela Manfrinato, Pa Moreno, Saulo Ligo, Deco Romani, Juca Ferreira e Nuno Moraes. Esses artistas da nova geração me inspiram a compor, porque são bons e quero ouvir a minha música na voz deles.

Como funciona o seu trabalho de composição?
Reprodução
É difícil explicar, porque, na maioria das vezes, para mim, letra e melodia chegam juntas. É difícil compor a melodia primeiro e depois colocar a letra, ou vice-versa. Normalmente é uma frase musicada que parece que alguém me sopra ao pé do ouvido, aí, se o "sopro" é bom, eu trabalho em cima dias, meses, anos, caçando notas, palavras. Na maioria das vezes, não concluo e o sopro vai embora para ouvido de outro compositor. Porém, alguma coisa termino – algumas em parceria, mas a grande maioria sozinho.

O Que Deu no Bicho? está na internet, mas também pretende disponibilizá-lo em CD. Como está vendo esse mercado?
O disco é o primeiro do selo Fio de Bigode. Após seu lançamento, temos outros artistas locais que pretendemos gravar. Queremos mostrá-los ao mundo. O Que Deu no Bicho? é o primeiro de muitos outros que não têm oportunidade de gravar de forma independente – pelo menos, é o que esperamos.

Fale do selo Fio de Bigode.
Nós vamos produzir. Vamos remar contra a maré, porque acreditamos na música de qualidade. Acreditamos no talento se sobrepondo à tecnologia. Acreditamos mais no sentimento do que no formato dito comercial. É por isso que vamos prensar CD, prensar vinil, distribuir pela Tratore, vender pela internet. Não só eu, mas todos os envolvidos acreditam que esse é um momento bom para a música popular, a verdadeira música popular.

A internet pode ser mais uma ferramenta, porém, é preciso saber usá-la a favor do artista. Com ela, o artista ganhou um espaço importante de destaque, entretanto, vale lembrar que isso foi um efeito geral, ou seja, todo artista está lá. É um universo que, se o público não se nortear, não irá servir para nada. Vai tudo continuar segmentado, e quem quer ser visto, ouvido, continuará cantando para a mesma meia dúzia. O selo vem para que isso não aconteça. Vem para conectar público e artista, fortalecendo o cenário local e expondo a nossa produção.

Fazer samba, ou melhor, compor no interior de São Paulo é difícil?
Compor coisa boa não é tarefa fácil. Porém, o mais difícil é ser gravado. Às vezes, o intérprete prefere um compositor consagrado, outras vezes o produtor não gosta do compositor, ou então a música que você acha que era boa, na verdade, é péssima [risos]. Mas é tudo uma questão de tempo. Tudo tem o seu tempo, e aqui parece que esse tempo anda um pouco mais lento. A produção musical dos grandes centros é maior. E aí entra o lado bom da internet, que encurtou essa distância geográfica.

Agora, é preciso estimular as pessoas a buscarem coisas boas, com qualidade. Não sou contra a música de entretenimento, mas quero que o grande público conheça e tenha acesso à arte. Não acho justo boa parte da população não se emocionar ouvindo música. Por isso, é importante fomentar o trabalho cultural local, preservar as tradições culturais da cidade. Com esses valores, essa vivência, o cidadão tem o discernimento do que é arte e do que é entretenimento. E não tem nada a ver com dinheiro. Tem a ver com educação e fomento cultural.

Nesta sexta-feira você faz o pré-lançamento no Colombina. São duas perguntas: o que pensou para o repertório? Quando será o lançamento oficial?
Escolhemos o Colombina porque acho que é o retrato perfeito do disco. É um reduto boêmio, como o próprio Largo, a Rua do Porto. Faremos um lançamento oficial depois, mas o local não está definido. As dez faixas do disco serão apresentadas no dia do show, além de um bom recheio com muito samba paulista, Adoniran, Vanzolini e outras canções autorais, minhas e do Saulo Ligo.

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