Sylvio Fraga: música e poesia em um caminhão neste domingo no Engenho Central
(Imagem: João Atala/Divulgação) |
Por Henrique Inglez de Souza
O músico e poeta carioca Sylvio Fraga vem a Piracicaba neste domingo (18) para dois eventos gratuitos no Parque Engenho Central. O primeiro será a atividade Oficina de Escuta, às 11h, com inscrições pelo site Projetocircuitobrasil.com.br. O segundo compromisso é um show, às 16h30, com o seu quinteto, para promover o novo CD, Cigarra no Trovão. O trabalho traz canções autorais, como Pedras Brancas e Samba da Cigarra. O detalhe é que a performance ocorrerá em um caminhão que se transforma em palco. Nem jazz, nem MPB, nem rock... para o compositor, o que faz chama-se música criativa.
A curiosa estrutura faz parte do projeto
itinerante Circuito Brasil, que até novembro terá visitado 20 cidades em São Paulo,
Rio de Janeiro e Minas Gerais. Na estrada, acompanham-no Bruno Aguilar (baixo),
José Arimatéa (trompete), Lucas Cypriano (piano, teclado) e Mac Willian Caetano
(bateria). Daqui eles seguem para Campinas e São José dos Campos.
Além da veia musical, Sylvio Fraga, que
é economista por formação, tem livros de poesia lançados, sendo o mais novo deles
Cardume,
editado recentemente pela 7 Letras. Leia a entrevista que fizemos com ele.
Você
classifica seu som como "música criativa". O cenário artístico, de uma forma
geral, está ganhando sentidos mais amplos hoje em dia, não?
Não sei bem se classifico assim, talvez
isso seja justamente uma fuga da classificação. Buscar nome para encapsular o
que se faz dentro de uma arte é uma simplificação. E é muitas vezes
determinado, historicamente, a posteriori. Do ponto de vista do mercado, quem
faz isso quer categorizar para distribuir, encontrar lugar numa prateleira. Até
aí tudo bem, mas é algo que não interessa a quem faz parte do processo
criativo. A gente só quer criar e tocar! Por essa razão, talvez o
"criativa" depois de "música" – mais nesse sentido: da
constante busca estética.
O que fazem Thiago Amud e Pedro Carneiro,
do Rio de Janeiro, Luiza Brina e Rafael Macedo, de Belo Horizonte? Sei que
trabalham incessantemente a canção. Mas a canção é infinita, as influências de
cada indivíduo são muito vastas. O sentido amplo do cenário artístico tem bastante
a ver com o fato de o século XX ter acontecido.
A arte moderna floresceu, houve ruptura
por tudo que é lado, o tempo todo. Na poesia, o verso já foi contorcido e
enquadrado de todos os jeitos. O que nos resta? Conhecer o que aconteceu (sem
necessariamente ser capaz de discorrer sobre nada; é um conhecer intuitivo),
olhar para dentro de si e com as ferramentas disponíveis inventar algo que faça
sentido hoje. A internet ajuda a conhecer mais arte
com mais velocidade. Facilita o acesso. Não acho que seja por conta da internet
que a arte ganhe sentidos mais amplos. É uma questão intrínseca à própria arte
e sua transformação ao longo do tempo.
Cigarra no Trovão avança em que aspectos em relação ao disco
anterior, seu debute?
O ponto de partida do disco são as
composições. Tudo se constrói a partir delas. A natureza dessas composições
acompanha minha vida, o mundo, aquilo que leio, ouço, faço, estudo etc. – e tudo
isso está sempre em movimento. Se meu jeito de compor e de pensar arranjos não
mudar, tem algo de errado.
A partir das composições, a banda. A
formação mudou, virou quinteto. A mudança de trio para quinteto transforma simplesmente
tudo, abre milhões de possibilidades. O primeiro disco era de violão, baixo
elétrico e bateria, tudo em torno disso. Acho que no novo os arranjos têm mais
um espírito de orquestração, ao mesmo tempo que têm mais momentos de liberdade.
Ademais, só ouvindo mesmo. É sempre difícil descrever música com palavras.
Apresentá-lo
de forma itinerante, e de cima de um caminhão, possibilita o quê, em termos de
performance?
Em primeiro lugar, uma turnê – algo que
nunca fiz – permite aprimorar uma apresentação bem mais do que quando se faz
shows esporadicamente. Não sei o que isso permite em termos de performance... Provavelmente
uma performance melhor, mais azeitada. Levamos conosco nosso sistema de som,
então esse controle absoluto da qualidade sonora facilita bastante o nosso
trabalho. Dá muito mais gosto tocar com sonoridade caprichada, sabendo que os
detalhes são valorizados. Dá mais tesão. O aspecto itinerante é maravilhoso, um
sonho. Conhecer o Brasil tocando, levar a nossa música para dentro desse país
gigante, ainda mais com shows ao ar livre! É muito bom sair dos centros urbanos!
Todo o contexto é muito estimulante.
Falar do nosso processo criativo na Oficina de Escuta, mostrar reproduções de
pinturas de Antônio Garcia Bento (1897-1929), pintor que estudo há anos, doar
os livros de poesia contemporânea... E é um palcaço erguido em lugares
inesperados. Vai ser emocionante!
Seu
novo livro de poesias, Cardume, é uma
costela do disco, ou vice-versa?
São mundos paralelos que se alimentam um
ao outro, que estimulam um ao outro. Se fico emperrado numa canção, posso
sempre me refugiar no silêncio dos poemas. Há certa competição também, interna,
entre os poemas e as músicas: qual dos dois está expressando melhor ou
resolvendo melhor o que sinto.
O
Brasil tem um público bom e consistente, quando se trata de consumir livros de
poesia?
Bom, consistente e microscópico. Acho
muito curioso que a praia de Copacabana tenha uma estátua do Drummond e não do
Pelé – recitaram A Flor e a Náusea na
abertura das Olimpíadas! O mundo todo ouviu aquela obra-prima. Já sei: vou
classificar minhas músicas como "crimes suaves que ajudam a
viver". Mas mesmo assim,
pouquíssimas pessoas leem poesia no Brasil. Não sei por quê. A cultura de massa
e sua velocidade engolem quase tudo.
Por
que alguém apaixonado por música e poesia foi fazer Economia?
Eu tinha 18 anos quando comecei Economia.
Ainda não sabia que a arte poderia ser o centro da minha vida, da minha vida
profissional. Não tinha nenhuma referência próxima, não conhecia artistas. Quanto
à Economia em si, escolhi porque sempre admirei a maneira de pensar dos meus
pais e associei isso ao curso deles na faculdade. Fez sentido na época. Foi bom
ter atravessado o curso. Ter esse ponto de vista em relação ao mundo é bom. Não
é algo comum na educação dos artistas.
Veja Sylvio Fraga tocando Pedras Brancas (aqui com uma formação mais ampla do que a que virá a Piracicaba):
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