Peça 'Réquiem' aborda violência e homofobia este final de semana no Garapa

(Foto: Divulgação)

Por Naiara Lima

O ator piracicabano Marcelo Oriani, que está em São Paulo há cinco anos, volta à cidade com um texto próprio, encenado pela Cia. Façamos Assim. O espetáculo Réquiem será apresentado neste sábado (22), às 20h, e no domingo (23), às 19h, no Ponto de Cultura Garapa. A peça trata da homofobia a partir de situações reais. A entrada é gratuita. 

Dirigida por Amanda Stahl, a montagem estreou este ano, em São Bernardo do Campo (SP). No elenco, Arthur Martinez e Oriani. O projeto conta com o apoio do ProAC (Programa de Ação Cultural) da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo. Depois da apresentação, haverá um bate-papo com o público sobre a importância da criminalização da homofobia e outros assuntos presentes na peça.

Oriani conversou com o PiaparaCultural. Confira!

Réquiem é seu primeiro texto dramatúrgico?
Esse não é o meu primeiro texto, mas o primeiro encenado profissionalmente por uma companhia. Fiz dramaturgia em São Paulo na SP e LT. No curso, todo semestre temos que apresentar um projeto autoral. Escolhemos um recorte de tema que vamos abordar. Em 2014, eu estava com um projeto de escrita, mas em virtude da morte de um amigo próximo, por conta da homofobia, e também porque ouvíamos muito na mídia sobre essa questão (vários casos de agressão ganhando visibilidade), isso tudo me incomodou. Então, aproveitei que tinha que escrever para falar sobre isso.

O que exatamente te motivou a escrever?
Foi justamente o que contei: surgiu de um fato real. Depois, comecei a entrar em contato com pessoas que sofreram ataques homofóbicos, sobreviventes, e também a conhecer casos de vítimas que morreram. Pesquisei teses de doutorado para elaborar de maneira ficcional essa dramaturgia, mas o disparador foi um caso verídico. Aliás, tudo o que está na peça é real – o que é bem triste, especialmente por sabermos que foi escrito em 2014 e que continua atual. 

O teatro é como uma crônica de um tempo. Então, seria maravilhoso que algumas dessas crônicas funcionassem apenas para a época em que essa peça foi escrita. É muito triste saber que, neste aspecto, as coisas estão andando bem devagar.

Como foi construído Réquiem?
A estrutura da peça acontece de traz para frente. Normalmente, os textos têm uma ação seguida de sua consequência – ação e consequência. Por exemplo, primeiro, eu te dou um tapa e depois você sente a dor. Na peça, acontece o processo contrário: primeiro eu sinto a dor e depois vem o tapa. Quando estava elaborando, tentei responder à seguinte pergunta: o que você tenta matar no outro que a morte não é suficiente para eliminar? Três facadas são o suficiente para matar uma pessoa. Em crimes de homofobia acontece uma exacerbação da violência. Por que é preciso dar cem facadas em uma pessoa se bem menos bastaria? Mesmo a pessoa morta, o que ainda não morreu? 

A história é uma agressão que desacontece, pois o texto é rebobinado até o ponto em que acontece uma conversa entre o agressor e a vítima. É uma estrutura esperançosa, que dá a possibilidade de escuta e talvez de serem capazes de não permitir que aquilo aconteça.

Como é, para você, também atuar nessa montagem?
Inicialmente, quanto escrevemos o projeto, não iria participar. Eu ficaria apenas responsável pela dramaturgia. Porém, conversando com o Arthur [Martinez, ator], disse que seria maravilhoso se conseguíssemos achar dois atores gêmeos, idênticos, pois queria despertar na plateia a sensação de que esse personagem manta a si mesmo. Acabei entrando no espetáculo. 

Fazer a peça, como ator, é bastante dolorido. Meu texto foi para a sala de ensaio muito aberto, sem a necessidade de usá-lo inteiro, mas sim fragmentos. E queria muito que nos colocássemos, pois seguimos a linguagem performativa, que tem bastante dessa coisa do pessoal, de ter o ator em primeira instância. E assim é o texto: pouco personagem e mais atores narradores. A proposta é que o público não embarque na história, mas que entenda que, embora o que esteja vendo é teatro, acontece de verdade.

Fazer é um processo de modificação, sempre! Desses personagens que pesquisei, 14 deles morreram pelo simples fato de serem gays. Apesar de serem pessoas diferentes, todas morreram pela singularidade que tinham em comum. Não morreram porque eram o Alex, o João ou o Ed, mas sim porque eram gays – assim como eu sou! Então, é difícil, pois poderia ser eu. A peça também me faz olhar em outro sentido, como eu era um militante da causa sem perceber, já que se trata de uma postura política você ser afemininado em um país homofóbico e conseguir ir à padaria e voltar vivo.

Vocês fizeram a peça pensando em espaços alternativos, como o Garapa?
Quando entramos em sala de ensaio, sempre pensamos em algo intimista, que estivesse próximo ao público de alguma maneira. Primeiro, porque gostamos disso e segundo, porque acreditamos que a peça chega mais facilmente ao espectador. Então, sempre buscamos fazer Réquiem em espaços alternativos. E mesmo quando apresentamos em teatros convencionais, levamos o público para cima do palco conosco. 

Nossa estrutura é uma espécie de cabine, com elásticos e uma luz fria acoplada. Tudo tem uma metáfora. Mas independentemente dela, fizemos assim para caber em todos os lugares. Assim, conseguimos viajar bastante e não ficamos à mercê de espaços que não conhecemos.

Serviço

Espetáculo Réquiem, da Cia. Façamos Assim
Quando: Sábado (22) e domingo (23)
Horário: 20h (sábado) e 19h (domingo)
Local: Ponto de Cultura Garapa
Endereço: Rua Dom Pedro II, 1.313 – Alto
Grátis
Informações: (19) 3377-2001

Comentários

  1. Eu amo O Marcelo Oriani, ele é um escritor contemporâneo fabuloso. Merece sim ser destacado no meio dos clichês que temos hoje em dia. Ele é Do café da manhã ao jantar, com seus #microcontos, que particularmente nos inspira.

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