Vinho: papo com Sérgio Inglez de Souza sobre o livro 'Memórias do Vinho Gaúcho'
Sérgio
Inglez de Souza é um dos grandes conhecedores de vinho no Brasil. Seu mais recente livro chama-se Memórias
do Vinho Gaúcho, saiu no final de 2014, pela Editora AGE. Surgiu da parceria com Rinaldo
Dal Pizzol, respeitado e importante nome por trás da história do vinho do Rio
Grande do Sul. O trabalho foi resultado de longos anos de
pesquisa, visitas a campo e redação. A obra é composta por três volumes (o livro é um 3 em 1 de quase 4 kg). Aos curiosos e apaixonados pelo assunto vinho, o mapa da principal
região vinícola do Brasil foi devidamente detalhado nas 752 páginas produzidas.
Leia a seguir uma entrevista com o enófilo, que em breve dará dicas e toques sobre vinho aqui, no PiaparaCultural.
Pensando
na história do vinho brasileiro, por que a importância do vinho gaúcho vai bem
mais além do que o caráter regional?
Já havia iniciativas isoladas de plantio
de vinhos em outros estados, como nas cidades de São Roque, Jundiaí, Louveira e
outras, em São Paulo; no Paraná, especialmente no bairro italiano de Santa
Felicidade, em Curitiba, e em Minas Gerais, na região de Andradas. No entanto,
essas produções nunca conheceram notoriedade nacional, além de terem sido elas
próprias vetores de importação de vinho gaúcho.
A maior ligação da Serra Gaúcha com os
grandes centros, como São Paulo e Rio, resultou na difusão inicial do vinho
gaúcho pelos caminhoneiros que sempre traziam garrafões para vender. Hoje, ele está
na mesa de bons restaurantes, em festas e comemorações, e já faz tímidas
incursões no mercado internacional.
Para
render três volumes, há quanto tempo de história registrado no livro e quais são alguns dos pontos-chave do vinho gaúcho?
De história contínua, cerca de 140 anos –
de 1875 até o início do presente milênio. No entanto, o livro destaca alguns
episódios:
- A empreitada de jesuítas espanhóis na
região de fronteira, nas cercanias de Uruguaiana. Lá plantaram videiras e
fizeram vinho de missa
- A chegada dos imigrantes italianos, a
partir de 1875, cuja bagagem incluiu mudas de videiras europeias para seu consumo
cotidiano
- Introdução de videiras americanas e
adoção de enxertia. Combateu-se, assim, a praga da filoxera e foi garantida a
importação e o plantio de viníferas europeias nobres
- Assim, a vitivinicultura gaúcha passou
de uma produção de 100% de variedades americanas (chegando à participação de
cerca de 20% de uvas viníferas, as geram os bons vinhos) àqueles apreciados
pelos entendidos mais sofisticados
Sérgio Inglez de Souza (Chris Inglez de Souza) |
Que
tipo de peculiaridade mais a obra traz?
Uma constatação curiosa é que, enquanto
os espanhóis difundiram a vitivinicultura por todas as suas colônias, como o Chile
ou a Argentina, Portugal proibiu a plantação de parreirais e a produção de
vinho em sua colônia, para que não se criasse concorrência com os seus vinhos.
Por isso, ocorreu praticamente um vazio entre a nossa descoberta e a
Independência, mais de 300 anos de dormência para o desenvolvimento da
vitivinicultura brasileira.
Tivemos alguma iniciativa de
vitivinicultura pelos imigrantes alemães, praticamente inexpressiva, se
considerarmos o grande movimento iniciado, mais tarde, pelos italianos, que
foram os fundadores do vinho brasileiro. Os alemães, assentados no sopé da
Serra Gaúcha, também forneceram mudas aos italianos, que se estabeleceram serra
acima.
O Rio Grande do Sul italiano está
intimamente ligado ao vinho. Quem produz toma, quem não produz também toma.
Você entra numa casa e é recebido com uma taça de vinho. As construções antigas
são muito interessantes, a maior parte delas construída em função da produção
do vinho.
Que
lugar ocupa Memórias do Vinho Gaúcho na trajetória da sua vida?
Sempre gostei de vinho. Há décadas que
pesquiso, nas incontáveis viagens que fiz, pelo Brasil e pelo resto do mundo, a
produção de uva e de vinho. Percorri centenas de parreirais, além de vinícolas,
universidades, centros de pesquisa. Na Europa, enfiei-me em brenhas, campos
nevados, rincões inusitados. Nas Américas, andei por muitos países. Na Oceania,
diverti-me com as botas e bermudas dos viticultores e estudiosos. Onde estive conversei com todo tipo de
gente, aqueles de mãos grossas pelo trabalho direto, aqueles dedicados ao
estudo e os maestros do vinho, essa raça abençoada de enólogos.
Escrevi centenas de artigos para
inúmeras mídias, além dos livros sobre vinho. Eu já tinha palmilhado o Rio
Grande do Sul, conversado com muitos, alguns já falecidos, fotografado bastante.
Com tudo isso na bagagem, abri a mala do vinho brasileiro e debrucei-me em sua
história: estava na hora! Era necessário um trabalho que descrevesse a saga do
vinho brasileiro dos primórdios à consolidação na passagem do século passado
para o atual. Espero ter contribuído.
:::: Informações sobre Memórias do Vinho Gaúcho: faixaextra@gmail.com
:::: Informações sobre Memórias do Vinho Gaúcho: faixaextra@gmail.com
Comentários
Postar um comentário